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sexta-feira, 24 de julho de 2009

Quem não vê, mas enxerga

Vamos chamar o nosso personagem de João , nome real, de uma figura que muitos conhecem na Cemig, principalmente na área da TI-Tecnologia da Informação e com quem, aliás, aprendi muito na minha vida, como veremos abaixo. O João , tornou-se deficiente visual , quando menino ainda afinava varetas de pipas e acidentou-se aos nove anos. Daí em diante, trilhou o caminho que só os grandes vencedores costumam percorrer com brilho, principalmente num país cheio de dificuldades intransponíveis, mesmo para os que dispõem dos recursos de duas retinas e dois nervos óticos. Sem falar, naqueles que mesmo com todo esse aparato, fingem não ver.....
O nosso causo começa então, já com João trabalhando na área de Informática, nos idos dos anos 80. O nosso personagem, cumpria a sua jornada diária, saindo de sua casa e chegando à sede da Barbacena, como carona, ajudado pela boa vontade de um outro companheiro, que chamarei de Sávio. Na época, o transporte solidário não era tão comum, e neste caso, tornou-se fundamental devido à facilidade oferecida a João , numa espécie de busca e “delivery” diário movido pela solidariedade do amigo. O ritual era sempre o mesmo: Sávio estacionava nas imediações da Barbacena, e juntos seguiam para a sede, onde trabalhavam no 3. andar. O João , costumava ensinar os que sempre o ajudavam, instruindo-nos, na condução correta dos deficientes visuais. Coisas que aprendeu no Instituto são Rafael, onde foi mais mestre do que aluno. No saguão, pegavam o elevador, naquela época já lotado e chegavam ao terceiro andar. Lá postavam-se na fila em frente ao relógio de ponto, para as devidas marcações. Sávio marcava o seu ponto e João , sem ajuda, roçava o costado da mão ao longo da ficheira e localizava imediatamente o seu cartão, sem errar uma única vez Batia o cartão e pronto.. Ambos, com os pontos marcados, seguiam para a mesa de João , onde Sávio o deixava para iniciarem o trabalho do dia. Isso aconteceu por anos a fio, sempre com o mesmo ritual. Um certo dia, ambos estavam postados na fila para fazerem a marcação do ponto, quando Sávio percebeu algo de errado: Os cartões não estavam na ordem que sempre se encontravam e Sávio não conseguia encontrar o seu.
___ João, mexeram nos cartões e não estou encontrando o meu e nem vi o seu também, disse o amigo, com um ar de estranheza interiorana.
João , deu um passo adiante, e disparou o mesmo algoritmo que sempre fizera desde sempre. Roçou a mão por entre os cartões, e analisando mentalmente a disposição deles, por entre espaços vazios e preenchidos, disparou, após segundos de reflexão:
___Sávio, não mexeram nos cartões. A disposição das fichas não bate por completo. Não foram eles que mexeram nos cartões. .... Nós é que descemos no andar errado.... Não estamos no terceiro andar......
Sávio, assustado, olhou para as placas de identificação e constatou que a lotação do elevador os havia levado a descer no lugar errado. Assim, simples como o capim..
Daquele dia em diante, a TI aprendeu a sutil diferença entre os que vêem e os que enxergam. João deu a todos nós a lição, de que na vida não basta aprender a ver, tem que saber enxergar.....

2 comentários:

  1. Barbix,
    Eu não tenho palavras para expressar o que eu senti ao ler esse texto... Um sopro de ar fresco... Das pessoas que menos esperamos recebemos as mais surpreendentes lições.
    Abraços, continue contando casos do João.
    Fabix

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  2. Também convivi com o João. Era impressionante como sabia quem estava chegando pelo som do caminhar. Tem um defeito grave, mas não a falta da visão, é cruzeirense o coitado, mas acho que finge ser, pois pelo menos há alguns meses tinha um galo de estimação no quintal. Pior são os que teem falte DE visão, e não era o caso dele, nem do Barbieri.

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