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domingo, 4 de outubro de 2009

Indústria do Vocábulo

São 18:30 horas, de uma sexta feira, que fecha um outono decadente e silencioso . No 30. andar de uma torre de aço escovado e janelas fumê estilo GUI, espigada no centro efervescente de uma grande metrópole, um homem com uma listagem na mão adentra por uma sala enorme, suavemente carpetada, e se dirige à mesa do gerente geral, que lhe pergunta:
“Como foi a produção da semana ?”
Ele, de pé responde:
“Not so bad”, relembrando a última entrevista com Larry King.
“Para a área de informações gerenciais”, continua ele sem esconder uma ponta de orgulho, “cunhamos garimpagem de dados(data mining), limpeza de dados(data cleansing) e destilaria de dados(data distillery)”.
“Para a área de bancos de dados, produzimos o label “servidores universais”(universal servers) e o índice de recall foi excelente. Somente 10% dos pesquisados acharam que se tratava de movimentos religiosos”.
“ Na área de redes, entretanto foi fraco”, diz com resignação, “somente inventamos o rótulo de servidor proxy”.
“E os pedidos da semana?”, interroga o chefe, ainda olhando fixo para a tela azul do micro, que lhe apontava o quinto –fatal error- do Windows 95.
“Continuamos a trabalhar no setor Web, onde a encomenda é grande, mas as combinações já se esgotaram (dataweb,infoweb,sqlweb,interweb,netweb,web-all,cyberweb,dbweb,webworld,webweb) e até o Messias, aquele brasileiro que contratamos para o marketing, sugeriu Web-Camargo, …mas confesso que não entendi…”. Pano rápido.
Esse diálogo, obviamente ficcional, na realidade, poderia ter acontecido na hipotética WORDGEN-WORDIX, a mais importante usina mundial de produção de vocábulos e palavras. E quem é ela? Essa empresa, imaginária e sorrateira, prolífica e atuante, funciona virtualmente nos laboratórios, departamentos de marketing e teses de PHD dessa formidável indústria que tanto conhecemos. A Informática. Nela, até com um sabor de paradoxo, não se usa diretamente os computadores como meio de propaganda. Preferem o mais poderoso hardware do planeta. O Retroprojetor. Com uma CPU do tipo 3-M standalone, ou conectada a um servidor Powerpoint, todos os bugs desaparecem, as camadas se falam com ótima performance e o “market share” é sempre crescente….
Até uma palavra foi inventada para definir esse estado interessante em que vivem mergulhados os departamentos de marketing das empresas de Informática, em constante gestação por novidades. Buzzword: Essa palavra, que é usada para designar assuntos efervescentes do momento, normalmente récem saídos dos tachos da indústria, tem uma mensagem subliminar. Extraída, via onomatopéia, do sons das abelhas, no fundo sugere algo que faz barulho, tem um “quê adocicado”, mas não nos avisa de nada fundamental, a menos de uma picada dolorosa, por manejo indevido. Quase sempre associado a uma buzzword vem uma manifestação de tecnologia, pretensamente inovadora , com envólucros brilhantes, mas de consistência nem sempre tão revolucionária. Quase sempre tem algo de “deja ouvi” por traz das fitas de celofane que amarram essas soluções .
Você não deve mais se lembrar das rajadas de siglas e “buzzwords”, que já lhe estilhaçaram a curiosidade desde que você decidiu pela profissão de informata. Cliente Servidor, Internet,Intranet e agora Extranet(você sabe o que é uma extranet?). Se não sabe ainda, não se preocupe, pois daqui a pouco você já estará falando sobre isso, em plenário de botequim, com a intimidade dos experts.
Essa formidável indústria também já protagonizou definições equivocadas, principalmente no campo dos óbitos compulsórios. A linguagem Cobol foi condenada a câmara de gás no meio dos anos 80, com o surgimento das linguagens de 4a geração. Hoje, ainda permanece linda, leve e solta habitando importantes “libs” do planeta. Sem contar, que com o projeto 2000, os seus programadores valerão, no mercado, tanto quanto craques brasileiros no futebol europeu. No início dos anos 90, o mainframe foi condenado a revelia e posto no corredor da extinção irrecorrível. Hoje, segundo uma importante publicação americana de negócios, com data de capa de 07 de Julho desse ano, eles estão de volta.. Voltaram, segundo a reportagem, pois apresentam melhor relação de preço/performance e ROI(return of investment) do que a esquadrilha de máquinas Unix e Wnt, colocadas como servidores de dados e aplicações, na febre da tecnologia cliente/servidor.
Uma grande empresa do ramo eletrônico(8 bilhões dólares/ano) é uma das cinco empresas piloto no projeto de portar, de volta para o mainframe, um dos estratosféricos pacotes integrados de gestão, originalmente vendido para plataformas baixas. Os 500 gigabytes de dados armazenados e processados irão para o mainframe, de onde alias, nunca deveriam ter saido. A pesquisa apresentada aponta ainda, que hoje, aproximadamente 300 empresas estão retornando suas aplicações para o mainframe, e que em 1998, esse número atingirá a casa dos milhares.
E a redundância de dados? Definida como o pior dos males, na época do nascimento dos Bancos de Dados, hoje se torna um fator fundamental nos novos caminhos dos sistemas gerenciais. Os DataWarehouses e DataMarts do planeta, nada mais são do que replicações estratosféricas de dados, extraídas do ambiente operacional. Hoje estamos todos, sem nenhum rubor explícito, preparando os nossos ambientes de tomada de decisão, redundando( em grande parte) o arsenal de dados estocado desde sempre.
Essa produção acelerada de vocábulos e novidades na área de Informática em geral, e de dados em particular, já está resvalando nos limites dos sindicatos e dos conselhos regionais. Explico melhor: No início foi a Filosofia de Dados, Arquitetura de Dados e Engenharia de Dados(Informações), seguido da Administração de Dados. Depois numa incursão na área artística, vieram as técnicas de Modelagem, com os Modelos de Dados . Mais recentemente, novas áreas e profissões foram alcançadas pelos tentáculos dos produtores de palavras. A área de varejo foi agraciada com os conceitos de Armazém e Mercado de Dados(DataWarehouse e DataMart respectivamente) que trouxe a reboque a insólita Destilaria de Dados(técnica usada em projetos de DataMart e DataWarehouse, para se purificar os dados antes de sua carga e utilização).A área mineral também se faz presente nesse mesmo segmento com a Garimpagem de Dados(Data Mining) e a de estética (??) também participa com a novísima Massagem de Dados, pérola encontrada nos últimos seminários de DataWarehouse e que representa as técnicas de preparação e limpeza de dados, antes de serem mostrados aos usuários exigentes. A literatura sobre DataWarehouse também cita etapas de Data Cleansing(limpeza de Dados) e Data Nursery (algo como enfermaria/viveiro de dados), que mais parece ser dedicada ao tratamento dos velhos sistemas legados (Ims,Idms,Adabas,etc) que habitam os mainframes. É uma etapa, digamos, que antecede a geriatria de Dados.
E o futuro? Bem, os dados, após uma fase minimalista, onde foram encapsulados aos processos e se transformaram em meros objetos, com aguda crise de identificação, certamente merecerão a atenção do lado psíquico da Informática. Produtos para desemcapsulamento e reidentificação de dados e tratameto de síndromes de polimorfismo, certamente serão oferecidos pela indústria. Preparemo-nos, pois algo como Neurolinguística e a Holística de Dados deverão ser o “must” de uma temporada futura.
Que tal encomendarmos uma?

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